Nota do Comitê Mineiro de Apoio às Causas Indígenas

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Nós, do Comitê Mineiro de Apoio às Causas Indígenas, direcionamos essa nota à população de Belo Horizonte e a todos os órgãos, movimentos e instituições que tem o papel de resguardar e promover a igualdade racial na cidade de Belo Horizonte, assim como de resguardar a assistência social e a segurança alimentar das populações mais vulneráveis no cenário de enfrentamento à pandemia do coronavírus, com a finalidade de expor a especial situação de precariedade dos indígenas na cidade.

Atualmente, em Belo Horizonte, a maioria dos parentes residentes possuem como única renda a venda de artesanato e alguns realizam também a prestação de serviços domésticos. A comercialização dos produtos acontece em espaços públicos, principalmente na Feira Hippie e Praça Sete, escolas bem como em eventos diversos.

Parcela dos indígenas que residem em Belo Horizonte são aposentados e outros estudantes da UFMG, em trânsito na capital, já retornaram às suas aldeias assim que as aulas foram suspensas.

Entretanto, dos indígenas que permaneceram na cidade, contabilizamos 16 (dezesseis) grupos de famílias de 12 (doze) etnias diferentes, oriundos de 4 (quatro) países da América Latina. Tais famílias totalizam 45 (quarenta e cinco) pessoas que estão sem geração de renda. Somada à precária situação de não poderem comercializar seus artesanatos que lhe garantem a sobrevivência; há ainda o caso dos parentes venezuelanos Warao que permanecem provisoriamente no abrigo São Paulo, também em uma situação de grande vulnerabilidade social.

Nesse sentido, estamos diante de um impasse que precisa ser tratado com a máxima prioridade pelo Poder Público junto com as instituições de defesa dos povos originários: a presença Indígena na cidade.

Nós nos entendemos como luz, como presença criadora, como solução especialmente para os problemas que nos assolam no atual cenário mundial, resultado de um desrespeito pela mãe terra e exploração sem fins dos recursos naturais pelo homem branco e não devemos ser tratados como um problema. Assim, o desafio é a cidade entender esse lugar de preexistência e o direito de estar na cidade mediante um país e um continente inteiro que nos pertenceu e foi roubado para a invenção do Brasil.

Desta forma, é necessário fomentar, em caráter emergencial, medidas reparadoras que viabilizem nosso modo de viver na cidade, onde trazemos a história de resistência desde a invasão e a permanente guerra que vivemos, guerra esta que sempre evitamos.

Nós hoje nos organizamos para acessar os órgãos públicos e também a sociedade civil com relação à preeminência de resguardar nossas vidas, uma vez que a migração é um direito que para nós, povos indígenas, é tão comum que se os invasores não fossem tão gananciosos teríamos compartilhado nossos bens, comprado, feito trocas, como sempre o fizemos por milênios com tantos povos que já haviam chegado à costa brasileira. Mas sabemos como a história se deu.

Hoje, empobrecidos, os que estão na cidade não contam com o apoio da rede de proteção da FUNAI e tampouco das principais organizações indígenas do país que tem focado seu trabalho quase que exclusivamente nos indígenas aldeados, apesar da população indígena na cidade ser significativa e crescente.

No Brasil, os dados mais recentes do Censo de 2010 indicam que a população indígena atingiu 817,9 mil pessoas. Desse total, 36,2% residiam na área urbana e 63,8% na área rural. Belo Horizonte possui parte desses 36% da população indígena do Brasil, um número bastante expressivo para ser ignorado. Além disso, os indígenas migrantes também não são assistidos, com a justificativa de que a FUNAI só trabalha com indígenas brasileiros. Nós não aceitamos essas

barreiras, uma vez que nossa forma de organização ancestral não é regulada por barreiras geográficas e sim por pertencimento à raiz pré- colombiana.

Certos de contar com apoio da população e das instituições públicas e privadas que atuam em defesa das comunidades tradicionais, subscrevemos essa nota e aguardamos um posicionamento acerca das medidas para resolução da situação vulnerável aos quais os indígenas estão expostos.

Comitê Mineiro de Apoio às Causas Indígenas.